quarta-feira, 22 de abril de 2015

Maré enluarada

Mulher é lua.
Sabe quando estamos beira mar e vê-se a lua cheia refletida na imensidão das águas?
Então, isso é mulher! Esse acontecimento...
Não se engane, mulher é loucura.
Mesmo quando reprimida há uma profusão de sedes na mulher.
Mulher é onda. Quando te bate na cara cura e machuca em um reflexo só, liquefaz.
Mulher é lua.
Lua que sangra transmutações.
Lua animalesca, lua cíclica.
 Mulher é dor. Mulher atordoa a dor.
Mulher é calma.
Mulher é água, bubuia, mergulho.
Sabe quando lavamos a alma na queda brava da água doce da cachoeira? Então, isso é mulher!
Mulher é louca.
Eu, mulher.
Eu sou!

domingo, 19 de abril de 2015

Texto em primeira pessoa

Meu coração é um idealista inquieto, mas tanto quanto meu nome é fogo meu ascendente é de elemento terra. Cabeça na terra, pés ao vento.
Meu coração é inquieto.
Durmo pouco, acordo sorrindo.
Viver é um gozo, acordo tapiocando o paladar, durmo pouco.
Ao pé do morro: seis meninos mortos.
Ao pé da estrada: engole o choro e vai ser leve na vida.
A vida é realidade, a realidade é dúbia, eu sou dual.
Choro de saudade, choro de um peito rasgado em outras vidas, choro com as manchetes, a realidade é nua tal qual a mulher.
A mulher desnuda, a mulher floresce carne, poesia e caos.
Sou mulher e a realidade engasga.
Até quando eles vão bater na minha cara?
A rua entorpece, revolta, correria, força.
O dia segue morno na academia de artes de uma universidade federal qualquer.
Será que eles veem, mulher?
A noite chega fria, mas o chá é quente.
Pés no vento e na utopia de gozar de um teatro engajado.
Questões, questões, questões, viagens.
Dedos mornos na nuca.
A cada dia corto mais meus cabelos. E os desejos?
Ao pé do morro: seis pessoas queimadas e o panelaço bota comida na goela de alguém? De quem?
Meu coração é inquieto.
De noite já não durmo, minha linha alba esquenta, esfria e estremece.
Penso muito e falo às vezes.
Às vezes verborrajo, verbo ajo, verbo rasgo e esse tesão criativo é teatro?
Sigo mulher negra vomitando palavras, tenho comida na mesa todo dia!
Sigo no MOVE lotado e minha cabeça move no sentido contrário.
"Qualquer amor já é um pouquinho de saúde, um descanso na loucura..."
Ah, meu coração sangra todo mês e é inquieto por demais.
Durmo pouco, acordo sorrindo.


No olho da rua, nua!

Andando pela rua, mulher tem que correr
No olho da rua mulher é nua, no olho da rua mulher é nua
Andando pela rua, mulher vai trabalhar
No olho da rua mulher é nua, no olho da rua mulher é nua
Sou mulher cansada de tanta invasão
Já chega, chega de fiu fiu
Sou mulher cansada de tanta invasão
Meu corpo, meu corpo é meu espaço. Sou mulher!

No olho da rua mulher é nua, no olho da rua mulher é nua
Então, canta mulher!
Se liberta!
Então, vai ser mulher!
Se completa!
E assim sua alma vai falar...
E assim sua alma vai gritar...
Chorar não muda o sentido dos ponteiros!

Salve as Ayabás! Salve Oxum! Salve Iemanjá! Salve Obá! Salve Iansã! Salve Ewá! Salve a criação-molde de Nanã!
Salve a mulher... mulher da luta, mulher da rua, mulher do dia, mulher da resistência, mulher negra!
A rima é na rua, é toda hora, é toda nua, é toda gira. Salve!

No olho da rua mulher é nua, no olho da rua mulher é nua
Não venda sua opinião
Seu corpo, suas regras
Se erga e vista o que quiser
Confie em você, mulher
Raiz, saber, poder e ação
O olhar da luta só vê quem de luta é

Mulher calada, cabeça baixa - Não!
Me fortaleci com força e fé, sou mulher!
No olho da rua mulher é nua, no olho da rua mulher é nua
Hoje eu não seria nada se não fossem as guerreiras de outros tempos
O olhar da luta só vê quem de luta é

No olho da rua mulher é nua, no olho da rua mulher é nua


(por Maíra Baldaia e Lucas Costa)

Espelho d'água

Ela tem um brilho no olhar que é só dela
Seu olhar silencia o meu
Sob uma boa luz seu rosto é tomado pelas mais perfeitas sombras
(Ah) o que faz dela mais bela ainda
Quando ela sorri é de peito aberto
Daquele jeito assim que só se vê quando carrega verdade na alma

Quando o segredo das entrelinhas e das linhas das suas mãos
Já não é mais segredo
Os versos escorrem do sol
Quebram ondas na retina
E ela lá, caminha...

Ela tem um olhar que chora e que é só dela
Apesar de tantos e de tudo
Ela quer ter pra quem cantar
Quer ter por onde ensolarar

Quando o segredo das entrelinhas e das linhas das suas mãos
Já não é mais segredo
Os versos escorrem do sol
Quebram ondas na retina
E ela lá, caminha
E ela lá, só, caminha.
E ela lá, caminha...

Avoadeira

Nega, nega, nega, vai voar!
Sina da gente é mesmo o amor.
Ôh, nega!
Nega, nega, nega, vai voar!
Viver de verões...
Um pé aqui, outro acolá!
Beber do simples
Espiar o mar
Sereia da noite espreita o caminhar
Crescer no embalo
Se transformar
Sorriso é coisa da gente não largar
Nega, nega, nega, vai voar!
Sina da gente é mesmo o amor.
Ôh, nega!
Nega, nega, nega, vai voar!
Viver de verões...
Um pé aqui, outro acolá!
Leva na mala todo aquele céu de chita
E segue a trilha de mãos dadas
No presente faz a rima
Ôh, nega!
E quando pousa é o destino que se pinta
Dança pela entrada azul e branca
Olhar de quem acredita
Nega, nega, nega, vai voar!
Sina da gente é mesmo o amor.
Ôh, nega!
Nega, nega, nega, vai voar!
Viver de verões...
Um pé aqui, outro acolá!

Canto da pedra que brilha


Por ser de lá que eu não ando sem os pés no chão
Que eu não faço todo dia menos de uma oração
Por ser de lá que eu não deixo de olhar o tempo
Que o vento brilha reluzente em pedras no chão
A pedra no caminho só ergue
Um coração que é de poemas não se esvai
A pedra de Drummond não é só dele
É canto de um povo e esse povo não morre mais 
Por ser de lá que eu me miro em pôr-do-sol
Por ser de lá de onde as pedras sempre brilham
Que eu não respiro, mas não deixo de caminhar
Num desatino nunca deixo de sonhar
Por ser de lá que eu não brinco em conversa mole
Mas o riso frouxo também vem me acarinhar
Por ser de lá é que eu peço todo dia
Pro pensamento não deixar de me avoar